A presença de pessoas com deficiência em museus, centros culturais e instituições artísticas ainda está longe de ser a regra. Apesar dos avanços legais conquistados com a Lei Brasileira de Inclusão (LBI), a plena realização dos direitos culturais passa por um desafio maior: transformar estruturas, escutar vivências e criar espaços de participação ativa. A arte só é pública quando é acessível. E acessibilidade, nesse contexto, vai muito além da rampa na entrada do museu. Trata-se de um conjunto de práticas, recursos e atitudes que garantem o direito de todas as pessoas com ou sem deficiência de vivenciar a cultura de forma autônoma, plena e significativa.
Nos últimos anos, discussões sobre inclusão cultural têm ganhado força em museus, centros culturais e espaços expositivos. E não por acaso: cerca de 23% da população brasileira declara ter algum tipo de deficiência, segundo dados do IBGE. É nesse cenário que pensar acessibilidade se torna urgente, transformando a maneira como produzimos, apresentamos e mediamos a arte.
O que é acessibilidade em exposições?
Acessibilidade em exposições é a aplicação de estratégias que permitem que diferentes públicos possam acessar e se relacionar com as obras de arte, o espaço expositivo e os conteúdos ali apresentados. Isso inclui:
- Acessibilidade física: garantir que o espaço possa ser percorrido por cadeirantes, pessoas com mobilidade reduzida ou baixa estatura.
- Acessibilidade comunicacional: adaptar os conteúdos para diferentes formas de percepção, como audiodescrição, Libras, legendas, linguagem simples ou materiais táteis.
- Acessibilidade atitudinal: formar equipes preparadas para acolher a diversidade sem preconceito ou barreiras invisíveis.
- Acessibilidade programática: pensar a programação e a curadoria de forma inclusiva, desde o início dos projetos.
O que é a Lei Brasileira de Inclusão (LBI)?
A Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015), também conhecida como Estatuto da Pessoa com Deficiência, é um marco legal que assegura os direitos das pessoas com deficiência à educação, ao trabalho, à saúde, ao lazer e à cultura. No campo cultural, ela determina que museus, teatros, bibliotecas e outros espaços públicos devem promover a acessibilidade em seus ambientes físicos e nos conteúdos oferecidos.
A LBI reconhece que o acesso à cultura é um direito humano e que cabe às instituições públicas e privadas criar as condições para que ele se realize de forma equitativa.
Termos importantes e o que significam
- Audiodescrição: narração de elementos visuais de uma obra ou espaço, voltada a pessoas com deficiência visual.
- Libras: Língua Brasileira de Sinais, utilizada pela comunidade surda.
- Leitura fácil: versão simplificada de textos complexos, facilitando a compreensão por pessoas com deficiência intelectual ou baixa escolaridade.
- Comunicação aumentativa e alternativa (CAA): estratégias que apoiam a comunicação de pessoas com dificuldades de fala ou escrita.
Exemplos de práticas acessíveis
Diversas instituições já vêm adotando soluções inspiradoras para tornar suas exposições mais inclusivas. Alguns exemplos:
- Audiodescrição das obras;
- Textos em braile e narrados;
- Plantas táteis;
- Áudios dos artistas contando sobre sua pesquisa e obra;
- Tradução em libras das atividades presenciais e online;
- Materiais de foco para pessoas com autismo, como lupas ou binóculos;
- Vídeos de apoio com legenda e libras;
- Iniciar todas as apresentações e atividades com autodescrição das pessoas que irão ministrar a açõ;
- Oficinas artísticas voltadas a pessoas com deficiência intelectual, promovendo vínculos entre saúde e arte;
- Materiais pedagógicos táteis para público cego, com base em leitura de imagem e recursos sensoriais;
- Exposições com curadorias participativas feitas por pessoas com deficiência;
- Adaptar exposições para crianças com autismo, criando ambientes acolhedores e menos sensoriais, ou sinalizando antes de cada sala os disparadores de possível sensibilidade.
Ideias de atividades de acessibilidade para exposições de arte
Se você está planejando uma exposição e quer incluir práticas acessíveis desde o início, aqui vão algumas sugestões:
- Mapas táteis ou plantas em relevo do espaço expositivo.
- Audioguias com narração descritiva e linguagem simples.
- Oficinas de criação com recursos acessíveis, como modelagem ou colagem para estimular múltiplas formas de expressão.
- Zines coletivos ou materiais participativos produzidos por grupos diversos (inclusive com pessoas com deficiência).
- Tours em Libras, com guias surdos e mediadores culturais bilíngues.
- Estação tátil com réplicas de obras ou materiais semelhantes aos das obras expostas.
- “Drawing tours”, em que visitantes são convidados a desenhar a exposição como forma de mediação sensorial.
A acessibilidade não é um complemento: é um direito. Mais do que adaptar espaços, é preciso reformular o próprio conceito de público. Quem participa da cultura? Quem curadoria representa? Que histórias ganham visibilidade? A resposta passa por escuta, presença e mudança estrutural.