Retratada ao lado de um instrumento musical e com um livro de partituras nas mãos, Marietta Robusti surge em uma das poucas imagens conhecidas que possivelmente representam a própria artista. A pintura, feita no final do século XVI, foi recriada com a ajuda de inteligência artificial, em uma tentativa de transformar o retrato pintado em uma fotografia fotorrealista. O resultado propõe um encontro entre passado e presente, convidando o olhar a imaginar Marietta como mulher real, viva, atuante.
Filha de Jacopo Robusti Tintoretto, ela ficou conhecida como “La Tintoretta” e foi uma das retratistas mais admiradas de sua época. Vestida de menino para poder circular nos espaços da oficina do pai, Marietta alcanou prestígio na Itália e fora dela, embora sua autoria tenha sido muitas vezes apagada ou confundida com a do mestre Tintoretto. A imagem recriada por IA, mais do que uma homenagem estética, é também uma forma de reinscrever sua presença no imaginário visual da história da arte.


Abaixo colocamos a imagem da obra original.

Quem foi Marietta Robusti?
Marietta Robusti nasceu por volta de 1552 em Veneza, sendo filha do renomado pintor Jacopo Robusti, mais conhecido como Tintoretto. Desde cedo, Marietta foi inserida no ateliê do pai, onde aprendeu as técnicas da pintura renascentista e se destacou como retratista. Seu talento precoce lhe rendeu o apelido “La Tintoretta”, uma forma de destacar sua filiação artística e também sua maestria nas artes visuais.
Seu trabalho era notável não apenas por sua habilidade técnica, mas também pela maneira como se posicionava dentro de um universo majoritariamente masculino. Entre as poucas mulheres artistas da Renascença italiana que conquistaram reconhecimento ainda em vida, Marietta produziu retratos e autorretratos com um domínio evidente da luz, da composição e da expressividade emocional. Em sua pintura mais conhecida, o autorretrato datado de cerca de 1578, Marietta se representa diante de um virginal, instrumento musical associado à domesticidade e à educação feminina. A escolha do cenário e dos objetos evidencia não apenas suas habilidades artísticas, mas também sua formação cultural e intelectual.
Os temas que atravessam sua obra estão profundamente ligados à identidade feminina e à representação de mulheres como intelectuais e artistas. Diferente do olhar idealizado ou passivo que predominava na época, Marietta apresentava mulheres em momentos de introspecção ou prática artística, sugerindo uma subjetividade autônoma.
Uma das curiosidades mais relevantes sobre Marietta Robusti é o modo como sua pintura dialoga com o espaço doméstico veneziano do século XVI. Estudos apontam que o virginal que aparece em seu autorretrato era um instrumento comum nos inventários domésticos da época, especialmente em casas lideradas por mulheres ou frequentadas por jovens em formação. Isso sugere que sua representação não era apenas simbólica, mas também realista, refletindo os ambientes onde ela própria vivia e criava.
Quanto à técnica, Marietta empregava as estratégias compositivas aprendidas no ateliê do pai, combinando o chiaroscuro (o uso dramático da luz e sombra) com uma paleta cromática rica em vermelhos, dourados e tons terrosos. Seus retratos mostram domínio da anatomia e da textura dos tecidos, além de uma sensibilidade particular ao olhar dos retratados. As expressões são contidas, porém profundas, muitas vezes iluminadas por um fundo escuro típico da escola veneziana.
Apesar de sua morte prematura em 1590, Marietta Robusti deixou uma marca significativa na história da arte.